domingo, 1 de dezembro de 2013

deidade

o poeta
engoliu
alma
naques
de bom
tempo
e arrotou
alforrias

com seus
sapatos
gastos
gatos
sem botas
gordos
e peçonhentos

tripudiou
sobre o tom
do dom
se ser
sem nunca
ter sido

o poeta
comeu
letra
podre
e morreu
na boca
das fugas
que tinha
cuspido


indolor


vivente
em furta-cor
de trégua

esperando
o pavio certo
para estourar


anunciação


a língua revisitada
desbrava a terra
dos telepáticos

a boca aberta
dos sentidos
vomita entrelinhas

(preferes regurgita?)

o eu de improviso


posso estar entre baganas tantas
braços de heroína crivados de ferrões
de angústias
olhos nebulosos sem órbitas
os nervos em frangalhos

posso ser andarilha
de becos e tonéis
ser puta
cabide de moda
costela aparente
uma fome de leão

posso carregar uns quilos a mais
ter nos programas de auditório o passatempo ideal
das novelas o amor technicolor high definition
duas ou onze crias agarradas à saia



 
posso ser a que escreve
noutro endereço
ter estampa de boa vida
um telhado de vidro
uma casa arte decor
mirantes a perder de vista

e posso ser nenhuma das tais

mas lembra-te disto: eu sou
sorte ou azar eu existo
porque os súbitos me fazem
intento
via para ditos marginais
usada por quem ainda teme
os efeitos da própria voz