domingo, 1 de dezembro de 2013

deidade

o poeta
engoliu
alma
naques
de bom
tempo
e arrotou
alforrias

com seus
sapatos
gastos
gatos
sem botas
gordos
e peçonhentos

tripudiou
sobre o tom
do dom
se ser
sem nunca
ter sido

o poeta
comeu
letra
podre
e morreu
na boca
das fugas
que tinha
cuspido


indolor


vivente
em furta-cor
de trégua

esperando
o pavio certo
para estourar


anunciação


a língua revisitada
desbrava a terra
dos telepáticos

a boca aberta
dos sentidos
vomita entrelinhas

(preferes regurgita?)

o eu de improviso


posso estar entre baganas tantas
braços de heroína crivados de ferrões
de angústias
olhos nebulosos sem órbitas
os nervos em frangalhos

posso ser andarilha
de becos e tonéis
ser puta
cabide de moda
costela aparente
uma fome de leão

posso carregar uns quilos a mais
ter nos programas de auditório o passatempo ideal
das novelas o amor technicolor high definition
duas ou onze crias agarradas à saia



 
posso ser a que escreve
noutro endereço
ter estampa de boa vida
um telhado de vidro
uma casa arte decor
mirantes a perder de vista

e posso ser nenhuma das tais

mas lembra-te disto: eu sou
sorte ou azar eu existo
porque os súbitos me fazem
intento
via para ditos marginais
usada por quem ainda teme
os efeitos da própria voz

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

exposição


noite
de ritual
caldeira tosca
na fogueira
cozinhando-nos
um tango

misturei
tua arritmia
à míngua
que assombrava
minha língua

a porção trágica
decantou-nos
um misto
de o grito
e les demoseilles
d'avignon

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

postulado



arreganham-se as presas 
do poeta.
foge da caça, musa!
 
 
tolo é o partir
que se finca espera!

 
assanha o brio
em desbocada lira
e te escreve sã
e salva da quimera!

domingo, 12 de maio de 2013

o sem nexo da cura



I
o dedo 
no interruptor
acende
pavio
curto
momento
de prazer

II
papel
giz 
de cera
um pequeno
dom
para o abstrato
e
uma
dose extrema
de alienação

III
os dedos
são vinte
ou sem
são livres
ou pés 
pelas mãos

 
IV
uma antena
para vênus
e
fio-terra
para
estímulos
vis

V
ansiolíticos
descomprimidos
e sais
sãos e salvos
do perigo
eu




 

quarta-feira, 17 de abril de 2013

vincent



a noite
é colorida
e os girassóis
são farsantes

a loucura
fez-se
fresta

o essencial
não faz parte
do corpo

vão-se
as orelhas
ficam as vozes

e seus súbitos

terça-feira, 16 de abril de 2013

banida

língua de víbora
sibila o tempo
pele fria
exala repulsa

os versos
são represas

comportam a pureza
que não tem asas
nem rasteja

não contêm
minha humanidade
meus répteis peçonhentos
que me transbordam

os versos
são represas
que me ignoram

domingo, 20 de janeiro de 2013

íntimo


das entranhas
às vezes lava
às vezes larva

porque é repulsiva
grande parte de nós